sábado, 28 de novembro de 2009

Joana Fulgêncio: nem eu sei porquê...

Deixo aqui um excerto de um texto publicado, hoje no Diário de Notícias, da autoria de Fernanda Câncio, sobre a morte da Jovem Joana, brutalmente assassinada pelo seu namorado.

E se mais palavras conseguisse escrever, mais escreveria para além de "profundo", "emotivo" e "revoltante"



É só porquês

por FERNANDA CÂNCIO in "DN"


(...)

Forte. Joana queria sê-lo. Umas vezes para se libertar, outras para suportar aquilo que lhe parecia um tormento impossível: amar sem ser retribuída, amar demais e ser amada de menos ou nada. Fazia força de escrever. Analisar, falar consigo e de si, guardar e comparar sinais, acumular como para feitiço tudo - cartões dele para ela, centenas de fotos, lingeries usadas, objectos trazidos de hotéis (por exemplo de um hotel madrileno onde pernoitaram a 6 de Novembro) - o que testemunhava uma relação de quatro anos com David Tiago Santinhos Saldanha, com quem começou a 3 de Julho de 2005 um namoro muitas vezes terminado e reatado. No seu quarto, a mãe descobriu livrinhos infantis com a transcrição de todas as sms dele. Descobriu folhas soltas com reflexões, apelos, ultimatos, desesperos. Descobriu diários. Por exemplo isto: "Não sei o que se passa comigo e às vezes é como se já nem me conhecesse. Não consigo lidar com os meus problemas, nem com a vida, que na maioria parece nem o ser. (...) Ele não é o David por quem me apaixonei e praticamente em tudo mudou."

O texto (reproduzido abaixo) não tem data. Pode ser de 2007 (como a entrada anterior do diário) ou de 2009. A relação de Joana, 20 anos, e David, de 22, passou vezes de mais por crises, por traições e por interrupções mais ou menos prolongadas para se poder situar este lamento: "Eu aprendi a gostar dele assim e ele habituou-se a ter-me só para ele! Desde que o conheci, não voltei a ser a menina que todos conheciam. Este amor estragou-me mas cresci de forma a enfrentar situações inéditas. Sinto ausência de carinho, do carinho e da atenção que ele me deu em tempos. (...) Agora sou dos tempos livres e das horas vagas. (...) Sinto-me incompreendida, sozinha, perdida. Preciso de atenção, o mínimo que seja. Sentir-me desejada e amada. Coisa que eu duvido. Dói, dói demais. No fundo, quero-te a ti com tamanha que tu não tens noção da imensidão. Entende-me, só te peço isso!"

Quando se encontrou com David no dia 17, Joana Cristina Fulgêncio Santos Silva estava zangada. Ou magoada. Ou esperançada. Provavelmente as três coisas. Na sexta feira anterior, tinha saído das aulas para ir ter com ele, como era hábito, ao T2 de Mangualde onde David residia sozinho (os pais, uma professora e um gestor que recusaram falar ao DN, moram em Celorico da Beira) e onde costumavam passar toda a noite juntos desde que a mãe de Joana, Paula Cristina Fulgêncio, 39 anos, empregada doméstica, lhe dera permissão para isso ("Eles de qualquer modo iam dormir juntos e ficava tão preocupada ao saber que ela vinha de Mangualde para Viseu às tantas da manhã que preferi que lá dormisse"). Mas, ao contrário do costume, Joana voltou para casa às 11 da noite. "Estranhei, mas ela disse-me que tinha de estudar para um trabalho de jornalismo e não insisti". Paula Cristina fala pausadamente, as palavras a direito como quem se equilibra no vazio. Na cozinha, o filho Óscar, mais novo que Joana, ouve a conversa, mas nunca vem à sala.

"Percebi que deviam estar chateados, mas era comum chatearem-se e reconciliarem-se, não me quis meter." Às vezes Paula metia-se - como quando, no Verão, David tinha combinado as primeiras férias a sós com Joana, na Figueira da Foz, e gastou o dinheiro que tinha para pagar o quarto, 600 euros, num iphone comprado a pronto num impulso de menino mimado. "Chegou a altura de irem de férias e ele nunca mais falou com ela. A minha filha andava numa infelicidade tal que me revoltei e liguei-lhe. Ele foi dizer aos pais que eu lhe pedira dinheiro. A mãe dele ligou à minha filha aos gritos." A seguir a essa cena, Paula proibiu a filha de namorar com David. Mas não durou muito. Não conseguia impedi-la de o ver e achou que não devia.

Mas Paula não foi a única a meter-se entre Joana e David: também os pais dele resolveram, a dada altura, cortar o namoro (os motivos prender-se-ião com a morte violenta do padrasto de Joana, muito falada em Viseu e nunca esclarecida). Os diários de Joana dão disso conta - e da animosidade que sentia pelos pais do namorado, que os invocaria para justificar quebras na relação, e até relações com outras pessoas. Um clima de manipulação e jogo que Paula, sentada na cama da filha de negro dos pés ao cabelo, resume no seu ritmo sincopado: "Ele aproveitava-se do amor da minha filha, não é? Cansou-se mas aproveitava-se dela. A essa conclusão já cheguei."

Naquela sexta-feira 13, então, Joana terá discutido com David. Tão violentamente que se chegou a comentar que os vizinhos do prédio de dois andares numa zona da periferia de Mangualde terão chamado a polícia. No prédio ninguém se acusa, à excepção de uma moradora que recusa falar a jornalistas: "O que tenho a dizer direi à GNR se vier cá falar comigo." Mas por pior que tenha sido a discussão na terça 17 Joana encontrou-se com ele. A mãe não sabe se se viram antes: no domingo a filha passou o dia em casa. Mas pode tê-lo visto na segunda. Ou até na terça à hora do almoço, quando Francisca Paiva, 20 anos, uma amiga comum que apresentou David a Joana e que está no mesmo curso que ele (mas no 2º ano), o encontrou a cinco minutos da casa da Joana, por volta da uma da tarde.

"Disse-lhe para dar um beijo meu à Joana, porque pensei que ia ter com ela. Quando o vi à tarde numa aula que tinhamos em comum, ele disse-me que já lhe tinha dado o meu beijo. Ele estava bem na aula, ou fingia estar bem. Como se não tivesse problema nenhum, como se não fosse fazer nada." Francisca cerra as pálpebras lentamente: "E fui eu que os apresentei. Se eu soubesse."

Se ela soubesse. Mas alguém sabe? "Quando encontraram o corpo e me disseram que tinha sido ele, eu estava sempre a defendê-lo, não podia crer". O namorado de Francisca, Sebastião Branquinho, dá-lhe a mão. "Um indivíduo que parecia tão certo e era um monstro. Todos temos uma sombra adormecida, mas a dele, quando acordou... Já me passou pela cabeça ir lá perguntar: 'O que é que te passou pela cabeça para matares a rapariga?' Sebastião levanta a franja espessa. "Depois de saber disto não dormi nada. Tenho 19 anos e a minha mãe tem 55 e pedi-lhe para dormir com ela. Já viu?"

Às 19.18 de terça, Paula recebeu um sms do número da filha a dizer que não ia jantar a casa. A linguagem era formal, nada parecida com a de Joana. "Mas estava a fazer o jantar e não sei porquê aquilo passou. Só liguei para ela às 9 e tal. Aí o telefone estava desligado. Comecei a tentar falar com ele e também não dava. Às três da manhã, em desespero, já tinha tentado todos os números que tinha de amigas da filha e ligou para casa dos pais de David. Eles não sabiam nada, mas pouco depois ligaram-lhe do Centro de Saúde, onde David tinha dado entrada, alegando ter sido sequestrado e drogado e gritando por Joana, que teria sido levada. Paula foi lá e a seguir começou às voltas de carro à procura da filha. Já era de manhã quando passou junto à barragem de Fagilde, perto do local onde o corpo do padrasto de Joana foi encontrado. Passou por um jeep da GNR e perguntou: "Estão à procura da minha filha?". A cara do homem deu-lhe a resposta. Precipitou-se para a barragem, onde havia já uma ambulância e carros da polícia. Não a deixaram chegar ao local on de o Peugeot 306 dos pais de David revelara ao cair o corpo da filha, guardado no porta-bagagens com um saco de plástico na cabeça, o crânio esmagado por vários golpes.

David terá dito que se descontrolou perante a reacção possessiva de Joana à existência de "outro relacionamento". Mas há muito por explicar e tudo por saber - tudo o que é impossível perceber. Na mesa do Fórum, onde supostamente Joana e David estiveram naquela terça depois de ela sair da frequência de inglês às 18.30, Francisca respira fundo. "Uma pessoa anda com outra anos, faz amor com ela e depois põe-lhe um saco na cabeça. Que amor é este? E como é possível tê-lo visto nesse dia e ele ter feito isto?"

3 comentários:

Anónimo disse...

a Joana nao merecia tamanha mostruosidade...

descansa em paz minha amiga :(

Anónimo disse...

a Joana nao merecia tamanha mostruosidade...

descansa em paz minha amiga :(

Anónimo disse...

Joaninha,eu como tua tiamais nova fico triste
Nao mercias eras linda e simpatica , bondosa e amavel
estejas onde estiveres adoro-te
e que aquele diabo que se destrua , é o melhor paara ele
da tua titi Diana que nunca te esquecerá