Por: António Costa in "Económico"
Dez debates depois, os portugueses conhecem melhor os programas eleitorais e o que os cinco maiores partidos candidatos às eleições querem fazer, mas também o que não querem e o que recusam fazer, e, por isso, podem votar com mais informação.
A 15 dias das eleições legislativas, das mais disputadas e com resultados mais incertos desde há muitos anos, há um primeiro balanço a fazer: José Sócrates, o que mais arriscava com estes debates, ganhou um duelo por KO, a Francisco Louçã, registou uma vitória dentro da margem de erro com Manuela Ferreira Leite e não perdeu os debates com Paulo Portas e Jerónimo de Sousa. Entra, por isso, reforçado no período de campanha eleitoral, e mais perto de uma vitória que já esteve próxima, mais distante e, agora, parece novamente possível.
Começemos pelo último - e mais importante dos debates -, o confronto entre José Sócrates e Manuela Ferreira Leite anteontem na SIC. A forma como os dois candidatos a primeiro-ministro chegaram ao debate de sábado não é indissociável da avaliação do que os dois fizeram. O secretário-geral do PS e primeiro-ministro tinha tido uma vitória rotunda, um ‘arraso' em linguagem popular, sobre Francisco Louçã, conseguiu mostrar, pela primeira vez, as fragilidades e incoerências de um partido de protesto que, agora, quer ser partido de Governo. Isso permitiu-lhe ganhar um novo fôlego à esquerda do PS. Já Manuela Ferreira Leite tinha tida desempenhos suficientes com os seus opositores, agarrando o seu eleitorado e o outro, o que desconfia do seriedade política de Sócrates, do seu estilo, classificado muitas vezes de plástico, por contraponto ao seu próprio, genuíno, sério e quase ‘apolítico'. Ainda assim, sem entusiasmar. Com este ponto de partida, e com os perfis e feitios de cada um dos candidatos, também se sabia que Sócrates teria mais a perder com eventuais erros e que Ferreira Leite teria de ser mais agressiva do que o costume.
Neste pano de fundo, é preciso dizê-lo, Sócrates ganhou o debate, dentro da margem de erro (em linguagem de sondagem), mas também é verdade que, mesmo com este resultado, Ferreira Leite superou-se, o que é dizer muito do potencial de cada um para os próximos quinze dias e para os próximos quatro anos.
José Sócrates marcou pontos, logo no início, com a discussão em torno da política da verdade e com a famigerada ‘asfixia democrática', levando Ferreira Leite a irritar-se, na primeira de muitas vezes, com as perguntas da jornalista Clara de Sousa, que fez um bom trabalho de moderação. Depois, Sócrates demonstrou as incoerências de Manuela Ferreira Leite, entre as quais as relativas às SCTU foram o caso mais gritante, e nem sequer nos grandes projectos de investimento como o TGV (ninguém falou do novo aeroporto) Ferreira Leite soube aproveitar a sua proposta alternativa. Não conseguiu explicar porque é que assinou, no Governo, uma resolução de conselho de ministros que propunha a construção do TGV, como projecto estruturante, com potencial de crescimento económico. O nível de endividamento é hoje diferente, para pior, mas se o projecto criava riqueza em 2003, nãos se percebe porque não cria riqueza hoje, riqueza essa necessária para reduzir o endividamento. E o argumento do fantasma espanhol é despropositado.
Ferreira Leite equilibrou o debate quando conseguiu desmontar as críticas de José Sócrates sobre a privatização da Segurança Social e da Saúde. E não perdeu o seu eleitorado natural, aquele que defende que os portugueses devem ter, e bem, uma alternativa, no sector privado, à oferta do Estado. Já na economia e nas finanças, perdeu de forma clara - terrenos onde, supostamente, tem vantagem - e também nos apoios às PME, bandeira desde há muito tempo da presidente do PSD. E mesmo na educação, onde Sócrates deu uma das notícias da noite, que foi o sacrifício da ministra que os professores tanto detestam, Ferreira Leite não ganhou mais votos do que aqueles que tinha antes do debate. Sócrates foi hábil na gestão dos temas e obrigou Ferreira Leite a estar permanentemente a justificar-se, como se tivesse sido ela a primeira-ministra dos últimos quatro anos e meio.
Sem o dom da palavra, Ferreira Leite mostrou frontalidade e uma agressividade q.b., que a beneficiou, desde logo porque a colocou ao nível do primeiro-ministro, como verdadeira e válida alternativa. Só perdeu quando mostrou uma irritação desnecessária, muito bem aproveitada por Sócrates. Mas Ferreira Leite esteve, em matéria de desempenho, no limite das suas capacidades, parece que fez o melhor que sabe e pôde, e o melhor que sabe e pode não faz dela primeira-ministra. Simplesmente, (ainda) não chega.
Como se constata das sondagens - como a da Marktest para o Diário Económico e para a TSF - que ainda não têm incorporado os efeitos dos debates e, particularmente, este último debate, José Sócrates tem uma vantagem, mas ligeira, dentro da margem de erro, o que se traduz verdadeiramente num empate técnico. O secretário-geral do PS tem-se esforçado por mostrar o que fez - isso também está sob avaliação - mas precisa também de sublinhar e ‘vender' o que quer fazer, aliás, como Ferreira Leite porque, ao contrário do que diz, o seu programa não é assim tão conhecido. Os portugueses sabem, sobretudo, o que não quer fazer.
Os próximos quinze dias vão ser decisivos, parece ser uma afirmação de La Palisse, mas hoje é possível dizer que serão mais decisivos do que se poderia esperar há quinze dias. E, como se sabe, a campanha eleitoral raramente é o momento para apresentar propostas e medidas, é mais um momento de frases, slogans e gaffes, ou seja, um ambiente mais favorável a Sócrates do que a Ferreira Leite. Sem perspectivas de maioria parlamentar, as contas de somar entre partidos vão começar a dominar as discussões, mais do que até aqui. O Bloco Central já está fora de causa, sobram as alianças governamentais e de incidência parlamentar à esquerda e à direita.
Prognósticos, só no final do jogo.
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